terça-feira, 27 de abril de 2010

farelos para uns, cacos para outros




o descaso do acaso
abandona farelos
que pra pés sem chinelos
são como cacos

um passo errado
o vermelho é certo
antes um sonho disperso
depois um pesadelo caro

para um distraído
não existe errado
tampouco o certo
apenas vidros
:
objetos intrometidos
e indelicados


Foto: Ines

segunda-feira, 19 de abril de 2010

uma tentativa de verdade sobre o "só dez por cento é mentira"




Sábado não foi um dia qualquer. Até seria, caso não tivesse tomado a decisão de ir ao cinema. O incrível diante dos meus olhos. Para eles sobraram lágrimas. Para meu semblante, um sorriso. Sempre fui apreciadora das palavras, principalmente quando estão a serviço da poesia. Por isso Manoel de Barros nunca me foi distante, mas também não tão perto quanto gostaria. Descobri o porquê. Uma timidez traduzida por muitos como aversão às entrevistas, câmeras e sucesso (como geralmente é concebido). Uma postura incomum, mas ser comum seria impossível para um ser que transvê o mundo como ele. Segundo o próprio: “O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação transvê.” Assistir a um documentário sobre poesia onde as rimas e as estruturas parecem inexistir, enquanto que a beleza existe na mesma proporção, ou até de forma absoluta, é entrar em contato no que há de mais moderno no que é feito dentro do gênero hoje. O impressionante é essa modernidade toda ser feita por um sujeito que possui noventa e quatro anos e que basicamente trata das “insignificâncias” da natureza. Admiração e orgulho é tudo o que possuo por esse ser. Encerro aqui. Uma enorme timidez me abate ao tentar escrever algo sobre alguém que diz que “Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras: liberdade caça jeito.”

Ilustração: Karmo.

terça-feira, 13 de abril de 2010

mundo




o mundo esgota
gota por gota
do fundo para a crosta
das nuvens para as pessoas

o mundo enjoa
de privada em privada
sopas reviradas
pelas bocas em desgraça

o mundo adoece
febre após febre
a pele desbota
a morte é cor da neve

o mundo morre
pulmão por pulmão
sorte dele ser
independente da civilização


Foto: Rui Miguel Pereira

domingo, 11 de abril de 2010

enfeite clandestino




a pergunta não feita
de tão imunda
clandestina enfeita
conversas inteiras
sem beleza alguma


foto: http://p-et-p.blogspot.com/