O nojo que não sinto das entranhas estranhas que até lindo acho.
Gosto que guardo embora não guardem.
Soco que não dou embora dêem.
Pouco para o que podia ser muito. Solto para o que podia ser mais preso.
Ainda me movo com o medo dos mortais. Porém tenho sina de não pertencer aos iguais.
Diante do que brilha demais é fosco. Brilho é desnecessário e não ilumina, apenas enfeita e ensina o quanto inferior é diante da luz que está todo dia por cima dos acontecimentos universais. Sendo eles eventuais ou fatais.
Entendimento para esses pensamentos dispenso. Para mim dispensar é transformar. Então transformo minhas linhas tortuosas internas em linhas externas retas. Transforma-se. Formas novas. Forma-se.
A possível desestrutura assusta porque aponta para um míssil que pode vir a qualquer momento de um avião que ronda minha cabeça. E não é loucura, nem preciso ir à rua. Vejo e escuto tudo do meu apartamento.
Ratha-Yatra é um dos festivais mais famosos e tradicionais da Índia, onde Jagannatha, Seu irmão Baladeva e Sua irmã Subhadra (que são reconhecidos como manifestações divinas do Senhor Krishna em forma de Deidades), celebram a chegada da primavera saindo de Seu templo em primorosas carruagens para, misericordiosamente, concederem bençãos a todos.
O platônico seria cômico se não remetesse a um desarmônico passado. Nele não havia como ir do interior para as margens do litoral não literal. Interior e exterior isolados. Interior com água doce era igual a uma vida sem sal.
Preciso da sobriedade esquecida em casa pela falta de espaço na bolsa. Insisto em carregar comigo a inutilidade esquecendo que ela anda sozinha, e quando quer, até voa atraindo outras, como andorinhas.
Se foi ou não sabotagem pouco interessa. E este pequeno interesse parte do fato que o mundo gira embora não seja depressa. Daqui de dentro, muitas tarefas para poucas horas. Enquanto que do universo, o vácuo torna o processo lento. Um dia não parece uma volta.
Por ser uma cidade de passagem, as estradas não possuem retorno. Os viajantes se distraem apenas uma vez com as paisagens. E não há consolo para os que nada vêem depois das seis. Como não há postes, depois dessa hora a única forma de luz é uma vez por mês com a lua cheia. Então ficam eles viajando com um desgosto, ou com o gosto de viagem mal feita.
A incerteza é um sutil traço no quadro que já é incerto, por ser abstrato. Mas a certeza nunca vem de fora, vem de dentro da cabeça. Depois que passa dos olhos é que se distorce a beleza de qualquer jeito que ela seja. Pelo simples fato de ser o que é belo para qualquer um que veja.
Quadro: Wassily Kandinsky - Sem título, comumente chamado " Dilúvio " ( 95 X 150cm ) - 1914
O espelho serve como prova de uma troca? Talvez um erro. E a tentativa de conserto não provoca o acerto. Pelo contrário, o real esnoba o simples reflexo que se sufoca pelo peso de ser o que é. Preso no quadrado das representações. E não há porta de saída em nenhum dos quatro lados. Explicado o medo de sair, já que seriam necessários cacos. Então a cópia se questiona: Ser o que é em pedaços? Ou não ser por inteiro?
"A minha grande nostalgia é de nada, é nada, como o céu alto que não vejo, e que estou fitando impessoalmente." (Livro do Desassossego - Bernardo Soares)
A estátua que trouxe uma flor.
Uma rua.
Pimenteira na Casa França-Brasil.
Lâmpadas e o anjo.
Palácio Tiradentes da varanda da casa França-Brasil.
Inundo meu mundo particular através de correntezas de palavras. As letras do alfabeto são como partículas de água. Então se moldam e cabem em qualquer lugar como se nada fosse.
E assim, de forma delicada molha os móveis e objetos ocupa a casa até o teto e obriga a pintura das paredes com novas e belas cores. O que significa no caderno muitos versos sobre...
Vi no Festival do Rio e recomendo: Annie Leibovitz; vidas retratadas ou Annie Leibovitz: Life Through a Lens (Título em inglês). Um pouco do filme aqui.
As mãos dadas mais antigas soltaram-se. Será para uma despedida? Ou será para um passeio? Passeando elas experimentam a sensação de estarem perdidas. Só se acha, quando se perde. Os anos às vezes pedem um labirinto para o caminho reto voltar a ser lindo.
Ela sente falta de pétalas brancas, aquelas que a simples admiração arrancam a paz que foi arrancada pela colocação do cimento que também arrancou a sombra, a grama e o vento.
E com tudo arrancado, o que lhe resta é a observação de canteiros. Pequenos coloridos entre prédios cinzas.
E para a vida num quadrado certo: regador. E para a vida acinzentada: remédios e um vaso no parapeito da janela com uma planta com uma flor de pétalas de qualquer cor.
"Que estou fazendo a te escrever? estou tentando fotografar o perfume."
"Escrevo-te este fac-símile de livro, o livro de quem não sabe escrever; mas é que no domínio mais leve da fala quase não sei falar. Sobretudo falar-te por escrito, eu que me habituei a que fosses a audiência, embora distraída, de minha voz." (Água Viva - Clarice Lispecor)